Ballet "Coppélia"

Outro dia, eu trouxe para o blog a versão mais recente de Coppélia exibida no cinema pelo Bolshoi. E, na ocasião, eu havia mencionado essa peça como sendo um ballet romântico. Eu sempre aprendi que o fim do romantismo no ballet se dá em 1870 e que Coppélia é sua última grande obra-prima. Eis que um leitor do blog, que acabou se tornando um amigo, me questionou onde eu teria lido essa informação, dizendo que Coppélia não é um ballet romântico. Confesso que eu me senti muito confusa... Ao comentar a respeito na fanpage do blog, eu me surpreendi com a enxurrada de comentários afirmando a mesma coisa. Eu simplesmente travei! Mas, como boa jornalista que sou, fui investigar essa história...
Recorri aos livros Contos do Balé, de Inês Bogéa, O Livro do Ballet, de Cyril W. Beaumont, e Dicionário de Balé e Dança, de Antonio José Faro e Luiz Paulo Sampaio, aos site do Bolshoi Ballet e Australian Ballet (ambas têm essa peça em seu repertório), o site The Ballet Bag e uma matéria sobre Ballet Romântico no blog do California Ballet.
A primeira coisa que pude constatar foi: nenhum dos livros consultados define se Coppélia é um ballet romântico ou clássico. Isso vem de encontro com uma coisa que o maestro João Maurício Galindo me ensinou: essas nomenclaturas usadas nas artes não são nada precisas! Um exemplo: o ballet A Bela Adormecida. Como dança, é inegável que a peça é o auge do ballet clássico, mas como música, é uma obra romântica. Confuso, né? E essa confusão aumenta ainda mais quando dizemos que Tchaikovsky é um compositor clássico, no sentido de que ele não compunha música popular.
Mas, um ponto interessante nessa história é que Arthur Saint-Léon não registrou sua versão coreográfica de Coppélia. Desse modo, as produções que conhecemos nos dias de hoje têm como base principal as remontagens russas do final do século XIX, datadas de 1884 (por Lev Ivanov) e 1894 (por Marius Petipa e Enrico Cecchetti), sendo a segunda a utilizada por Sergei Vikharev como modelo para a reconstrução do Teatro Bolshoi. Se partirmos desse princípio, poderíamos considerar Coppélia como um ballet clássico.
Entretanto, há dois detalhes a serem considerados: o primeiro é o fato de que, na produção original de Coppélia, o papel de Franz era interpretado por uma mulher, o que inviabilizava a criação de um pas de deux nos moldes clássicos. O segundo é que a estrutura musical na partitura original do terceiro ato traz um divertissement da seguinte maneira:

- Marcha do Sino
- Valsa das Horas
- O Amanhecer
- A Oração
- O Trabalho
- O Hino
- A Guerra e a Discórdia
- A Paz
- A Festa
- Galope Geral

Pois é... Originalmente, não há indicação de que essas danças sejam solos, pas de deux ou cenas de grupo. Essa organização surgiu a partir das montagens russas, época em que o terceiro ato da peça se popularizou. Segundo alguns sites que eu já li por aí, na época do lançamento, algumas pessoas consideravam o terceiro ato desnecessário, uma vez que o casal protagonista praticamente se reconcilia ao final do segundo. Notem que há uma grande diferença entre os dois primeiros atos (que são muito mais encenados) e o terceiro (que é inegavelmente clássico).
Mas, afinal de contas: Coppélia é Romântico ou Clássico? Há uma divergência de informações...
O site do Bolshoi afirma que é um ballet clássico. Já o do Australian Ballet faz uma colocação interessante: "Coppélia é um rescaldo do romantismo". Ou seja, o derradeiro, o último dos últimos.
É nesse ponto que entra a matéria do California Ballet, que questiona qual teria sido o fim da Era Romântica. Segundo o texto, parte dos estudiosos defende que o romantismo realmente tenha encerrado em 1870 com Coppélia. Da mesma forma que o romantismo literário teve diferentes fases, o romantismo na dança também passou por dois momentos: o primeiro, no qual predominam as peças com enredos trágicos e a presença seres etéreos, como Sílfides e espíritos, e o segundo, no qual as histórias mostram personagens terrenos e têm o intuito de levar o exótico ao palco. Nesse quesito, se encaixam os ballets Esmeralda (1844), Paquita (1846) e O Corsário (1856). Se observarmos bem, Coppélia também se enquadra nessa categoria: o primeiro ato é totalmente camponês, remetendo à essência dos ballets românticos. Seu grande diferencial são as danças folclóricas, como a mazurca (polonesa) e a csarda (húngara). No segundo ato, há sim a presença de um mundo imaginário, porém adaptado à realidade da época em que a peça foi lançada. Nesse período, vivia-se o advento da era industrial e os autômatos eram uma grande sensação, por isso, a imagem da mulher ideal e inatingível aparece na forma de uma boneca mecânica. O terceiro ato retoma o mundo real, com o desfecho da história.
Mas, a matéria também aponta que outra parcela dos estudiosos acredita que o verdadeiro fim do Romantismo na dança tenha se dado no término da década de 1840, não se sabe exatamente o ano e nem o porquê.
Levando tudo isso em consideração, fica difícil dar uma classificação exata para o ballet Coppélia. Por isso, acredito que outra colocação feita no site do Australian Ballet seja a melhor forma de definir essa peça: "Coppélia é o grand finale do romantismo e um prólogo para o ballet clássico".
Para encerrar essa história, vamos à gravação de hoje, na versão da K-Ballet Company.
Coppélia
Companhia: K-Ballet Company
Ano: 2004
Elenco:
Rina Kambe como Swanilda
Tetsuya Kumakawa como Franz
Stuart Cassidy como Dr. Coppélius
Download:
https://drive.google.com/file/d/1VQ2G9yNhTq7PMNeR9ea-O94lD8t1Os7_/view?usp=sharing

Formato do Vídeo: .mp4

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